Dramaturgia

Desde sua fundação, em 1993, a Téspis Cia. de Teatro sempre trabalhou com a montagem de espetáculos que nasceram a partir de diversos tipos de dramaturgia. Em nenhum momento de nossa trajetória, realizamos a montagem de um texto integralmente, sem ter efetuado algum tipo de versão, adaptação ou, no mínimo, recorte.

A partir de 2009, Max Reinert passa a estudar dramaturgia no Nucleo de Dramaturgia do SESI Paraná – Teatro Guaíra, onde permaneceu por 05 anos. Desde esse momento, a Cia. investiu na construção de um trabalho mais autoral, realizando a montagem de textos inéditos do autor.

Nesta página você encontra algumas das obras assinadas por Max Reinert, montadas pela Téspis Cia. de Teatro ou por outros grupos teatrais do país.

.
Obras Originais
impropriedades

foto by Nubia Abe

Pequeno Inventário de Impropriedades

* Primeira montagem pela Téspis Cia. de Teatro, direção de Denise da Luz, com estreia em abril de 2010

download —>>> MaxReinert_Pequeno Inventário de Impropriedades

“(…) E assim eu fiquei

Insensível

Meu corpo parou de sentir tudo que acontecia ao redor dele
Eu continuava vivo, mas não estava mais vivo
Seguia caminhando. Seguia comendo. Seguia vomitando. Seguia falando
Só não sentia
Mas não me compreendam mal: eu ainda tinha o tato
Eu ainda tinha visão e audição
Ainda tinha a capacidade de distinguir os gostos e os cheiros
Só não sentia

Dessa forma, não senti quando minha mulher cortou os pulsos
Não senti o corte e não senti a falta dela

Logo adiante encontrei outra namorada que, caso eu sentisse algo, diria que
era até mais macia que minha mulher
A namorada de número 02
– vamos chamá-las assim para facilitar a compreensão –
A namorada de número 02 também se matou
Gás
E eu, nada. Nem uma tosse sequer
A número 03, décimo quinto andar do prédio. Não senti o impacto
Número 04, overdose

E assim poderíamos seguir por um bom tempo aqui contando
Meu pequeno inventário de suicídios amorosos

Se eu tivesse capacidade de sentir algo poderia pensar que era eu quem
estava causando todos aqueles suicídios (…)”

blowMeUp - Curitiba 2012foto by Cayo Vieira

foto by Cayo Vieira

BlowMeUp ou Sobre a Natureza dos Homens Bomba

* Primeira montagem pelo Nucleo de Encenação do SESI-PR, com direção de Nika Braun, em dezembro de 2012.
* Leitura dramática pelo GET – Grupo de Estudos Teatrais, com direção de Denise da Luz, em março de 2016.
* Segunda montagem pelos alunos do Curso de Bacharelado em Teatro da PUCPR, com direção de Gabriela Figueiredo, em junho de 2016.

download —>>> em português: MaxReinert_BlowMeUp_PT
download —>>> em inglês: MaxReinert_BlowMeUp_EN

“(…) (pausa longa)

HOMEM QUE ESPERA SENTADO: Dias desses, assistindo à TV, vi um homem-bomba
Uma câmera de segurança quase que sem nenhuma intenção seguiu um homem por uma rua em direção a um hotel de luxo
Sem nenhum movimento suspeito
Calmo. Tranquilo até
Ele sentou-se no saguão do hotel
Folheou calmamente o caderno de esportes
Viu as notícias da página de variedades
Inteirou-se do aquecimento global
Informou-se sobre a economia
Levantou e foi ao banheiro
Escapou da câmera durante uns 15 minutos
Achava-se até que já havia ido
Voltou
Sentou-se
Novamente
Continuava calmo
Tranquilo
Nesse momento, pela porta do hotel, começam a entrar pessoas
Muitas pessoas
De todas as formas e cores. De todos os tamanhos e idades
Sozinhas. Acompanhadas
Em família Comendo sorvete Falantes. Tristes
Todas dirigem-se ao saguão do hotel
Todas dirigem-se ao homem-bomba
Todas dirigem-se ao momento em que o homem vira a cabeça sussurra algumas palavras e…
explode
Transforma-se em um clarão branco que interrompe a gravação

(pausa muito longa)

MULHER QUE GIRA OLHANDO O LUGAR ONDE ESTÁ E TEM UMA FACA CRAVADA NAS COSTAS:
Então…
morrer…
é assim? (…)”

Foto: Sérgio Vignes

foto by Sérgio Vignes

Hipotermia

* Primeira montagem pela Cia. O Ambulatório (Curitiba/PR), com direção de Gerson Delliano, em novembro de 2013.
* Segunda montagem pelo grupo Teatro Sim…Por Que Não?! (Fpolis/SC), com direção de Júlio Maurício, em setembro de 2014.
* Terceira montagem pelo curso de Prática de Montagem, ministrado pela Téspis Cia. de Teatro, com direção de Max Reinert, em junho de 2018.

download —>>> MaxReinert_Hipotermia

“(…)
Dois segundos
Dois segundos!!!!

Coisa de dois segundos

É, mais ou menos, o tempo que uma pessoa leva para reagir diante de uma situação de perigo A pessoa vê o perigo, toma uma decisão
e… reage

Coisa de dois segundos

Então é isso:
Sua vida depende de dois segundos

Agora, imagine que tudo o que eu lhes contar acontece em apenas dois segundos
Você inspira
Você levanta o pé direito e, ao abaixar, o apoia sobre o paralelepípedo
Você faz o mesmo com o pé esquerdo
Você escuta um barulho estridente
Você gira a cabeça 97 graus
Você vê o ônibus vindo em sua direção
Você vê o motorista olhando assustado para você
Você vê as pessoas dentro do ônibus se desequilibrando
Você vê o ônibus tentando desviar de você
Você deixa o sorvete cair de sua mão
Você tem o impulso de pular
Você sente o primeiro impacto do ônibus em seu quadril
Você sente seu corpo girando no próprio eixo
Você sente a queda, antes mesmo dela começar
Você sente o impacto contra o solo

Por dois segundos seu corpo pára de respirar
Por dois segundos seu sangue começa a escorrer pelo asfalto
Por dois segundos seu pensamento viaja pela sua infância
Por dois segundos seu batimento cardíaco ainda resiste
Por dois segundos seu olhar encontra as nuvens
Por dois segundos as pessoas se aproximam de você
Por dois segundos sua audição escuta palavras de consolo
Por dois segundos sua esperança ainda está intacta
Por dois segundos sua visão começa a ficar embaçada
Por dois segundos sua memória se esvai
Por dois segundos sua vida escapa de suas mãos

Quanto tempo você perdeu?
Quanto tempo você ganhou?
Quanto tempo você deixou?
Quanto tempo você guardou?
Quanto tempo você…

Dois segundos
Apenas dois segundos

Então é isso. Uma vida depende de dois segundos

(pausa) (…)”

foto by Viviane de Paoli

foto by Viviane de Paoli

Meteoros

* Primeira montagem pela Téspis Cia. de Teatro, direção de Max Reinert, com estreia em agosto de 2012.

* Segunda montagem pelo grupo Cia. de Teatro Oceânica (São Paulo/SP), com direção de Rita Giovanna, em fevereiro de 2018.

download —>>> MaxReinert_Meteoros

“(…) Ele (em off) : Agora você não sabe exatamente onde está
Seus olhos estão vendados
Suas pernas estão amarradas
Seus braços estão amarrados
Sua respiração está afobada
Mas vai se normalizar
Temos todo o tempo necessário

Agora você está pronta
Sua educação está prestes a começar
Você vai sentir dor
Você vai gritar
Ninguém vai escutá-la
Enquanto seu corpo resistir continuaremos seu processo de educação
Você vai desmaiar
Você vai passar por diversos estágios
No início você vai querer fugir
Depois vai querer desistir
Aos poucos vai se acostumar com a dor
Depois, vai começar a desejá-la

Para cada estágio eu serei obrigado a propor uma lição distinta

Para cada estágio eu serei um

Para cada passo você será outra

Mas, não se apresse
Temos tempo

Vamos começar? (…)”

.

Agora Sou Outra

* Texto ainda inédito.
download —>>> MaxReinert_AgoraSouOutra

“(…)
Léa (no escuro): Agora eu não choro mais
Antes eu não chorava
Antes ainda, eu era seca
Mas, ainda mais atrás, tenho a impressão de ter deixado algumas lágrimas
em algum lugar

Eu deveria lembrar
Mas eu finjo esquecer e, por isso mesmo, esqueço

Christine: Agora eu ignoro que vocês estão aí
Construo aqui alguma coisa que me ajude a ser outra
Diferente daquela que vocês achavam que eu era antes

Melhor?
Pior?

Outra! Distinta

Que finge tudo o que se passa aqui
Que morre no final
Logo ali

Léa: Mesmo assim, eu não choro mais
Mesmo que antes eu não chorasse
Mesmo que algum dia eu tenha sido seca
Mesmo que lá atrás eu tenha tido a noção do que são lágrimas
Mesmo que eu me lembre. Mesmo que eu finja
Mesmo que, agora eu…

Christine (completando): …agora eu nasci
Agora eu sou uma mulher

Léa: Agora eu estou com 03 anos de idade
E talvez essa seja minha primeira memória
Talvez eu esteja no quarto, dormindo

Christine (como um eco): Talvez  (…)”

.

foto by Lenon Cesar

Índice22

* Leitura dramática por Juliana Galdino (Club Noir, SP), em março de 2016

* Primeira montagem pelo grupo Téspis Cia. de Teatro, com direção de Max Reinert, em agosto de 2018.

download —>>> Max_Reinert_Indice_22

“(…)
Inspire

Você leva uma vida normal Junto de pessoas normais Um dia-a-dia normal Você sai de casa Você vai ao supermercado Você caminha Você fala ao telefone Você assiste ao noticiário Você vê uma quantidade imensa de informações desnecessárias Você sonha com uma vida melhor Você escuta músicas ruins Você vê filmes ruins Você no fundo sabe que sua vida é ruim

Tudo o que você quer é que algo aconteça

Você olha para a cara da sua mulher Você olha para a cara do seu marido Você olha para a cara do seu namorado Você olha para a cara da sua namorada Você olha para a acara do cara que te atende no caixa do supermercado Você olha para a cara do michê que contratou para te fazer gozar Você olha para a cara do atendente da farmácia que insinua uma piada sem graça sobre as coisas que você pretende comprar Você olha para a cara de sua mãe e imagina que ela está morta Você olha para a cara de sua mãe e pede perdão por não amá-la tanto quanto você acha que ela te ama Você olha para a cara do seu traficante Você olha para a cara do motorista de táxi pelo espelho retrovisor Você olha para alguém passando na rua como quem busca uma salvação

Tudo o que você quer é que algo aconteça

Você olha em volta Percebe que não sai do lugar Escuta um ruído Algo te chama Sente calor Sente frio Sente uma luz que atinge teus olhos Te cega Sente que algo cresce dentro de você

Agora
a salvação não está lá fora

O fim é

O fim é

(…)”

Foto: Lote84

foto by Lote84

Esse Corpo Meu?

* Primeira montagem pela Téspis Cia. de Teatro, direção de Diego Cazabat, com estreia em março de 2014.

download —>>> MaxReinert_Roteiro_Esse Corpo Meu

“(…)
Cena 05
Corpo Paródia

Os corpos retornam e já quase não se reconhecem ingênuos. Os acúmulos começam a pesar sobre eles. Retornam ao jogo, mas algo parece impedir que o mesmo seja prazeroso como era antes

Vozes em Off: Ao invés de um fragmento de filme, uma cena de teatro
Uma paródia
Um homem que imita um homem que imita um homem que imita
Uma paródia da paródia da paródia
Seguimos a cena até encontrar a paródia original?
Transitamos uma ideia

O homem me olha
Busca em suas memórias a paródia de uma lembrança
Boa

Assoprar as velas do bolo de aniversário
Um casal caminhando na praia de mãos dadas
Uma família tomando café da manhã em um dia de sol
A primeira valsa da MeninaMulherPérolaAndante
O bouquet da noiva flutuando no ar em câmera lenta
Paródia da paródia da paródia da paródia

TransParódia
TransPassar
TransLinear
Transexual
Transformar
Transpirar
Transssss
Nnnsss
sss

Pergunto-te onde se acha a minha vida
Em que dia fui eu
Que hora existiu formada de uma verdade minha bem possuída
Vão-se as minhas perguntas aos depósitos do nada
E a quem é que pergunto?
Em quem penso, iludida por esperanças hereditárias?
E de cada pergunta minha vai nascendo a sombra imensa que envolve a posição dos olhos de quem pensa
Já não sei mais a diferença de ti, de mim, da coisa perguntada, do silêncio da coisa irrespondida
(…)”

.

Obras Inspiradas em Outros Autores
Foto by Criadoria

foto by Criadoria

Tomara que Não Chova! ou a inscrível história do homem que se transformou em cachorro

Livremente inspirado em Samuel Beckett, Osvaldo Dragun e Marina Colassanti
* Primeira montagem pela Téspis Cia. de Teatro, direção de Max Reinert, com estreia em setembro de 2015.

download —>>> MaxReinert _ Tomara Que Não Chova

“(…) (Mudança de clima. Ele afasta-se. Ela dirige-se ao centro do palco onde há um cubo. Levanta do piso uma máscara. Coloca em si)

Ele: Fazia um tempo que aquela sensação de desemparo não o encontrava. Ou talvez ela estivesse sempre ali. À espreita. Enquanto ele fazia força para se manter de pé. Setecentos e cinquenta quilos de aço, cimento e mármore sobre os ombros. Setecentos e cinquenta anos de expectativas sobre o cérebro. Tudo arranjado de tal maneira que ele, durante um tempo razoável, pôde fingir confortavelmente ser feliz. Mas, se por acaso, em algum momento ele se distrai? Numa tentativa patética de descobrir onde errou, revira as memórias. Tenta encontrar uma maneira de colocar a culpa nos outros. Como se os outros não estivessem somente tentando manter-se de pé. Tentando desesperadamente encontrar, sob setecentos e cinquenta quilos de motivos, razões para continuar ali. E enquanto se debate tentando esconder o desamparo, o aço, o cimento, o cérebro, os furos e os disparos, o tempo passa.

Ela (para o público): Onde agora? Quando agora? Quem agora? (Pausa. Apontando para a máscara) Eis um homem. Quase humano. Dizer humano. Mas nem sempre é suficiente ser homem. O fato, se é que podemos falar de fatos, é que, às vezes, somos quase. Ele. Dizer ele. Nasceu homem. Não nascemos todos? Mas hoje, se é que sabemos que dia é hoje, ele é quase. Quase homem de tão pobre. Quase preto. Dizer preto. Quase branco de tão pobre. Dizer pobre. Quase humano. Quase. Quase cachorro. Quase. E estava triste. Dizer triste. Ele era quase nosso amigo. Poderia dizer vizinho. Quase vizinho. Poderia dizer conhecido. Ele procurava trabalho. Dizer emprego. Ele procurava emprego. Ele precisava sustentar sua família. Ele sonhava com a vida. Dizer sonho. Ele acordava gritando durante a noite. Ele. Não dizer mais ele. Isso. Dizer isso. (pausa) Isso acordava gritando durante a noite. Isso quase preto de tão pobre. Ou quase branco. Quase branco de tão pobre. Isso quase humano. Dizer quase. Vivendo agora aqui. Onde aqui? Dizer canil. Isso viver aqui agora. No canil. Dizer canil. Isso. No canil. Agora (…)”

.

Interessados em montar algum dos textos devem entrar em contato diretamente com o autor através do e-mail maxreinert2@gmail.com.